Leilão da Liberdade

 

LEILÃO DA LIBERDADE

 

            Há um tempo aqui em minha cidade surgiu um murmurinho, dando conta de que uma dupla de jovens mulheres estavam revolucionando o comércio do entretenimento com uma proposta de uma rifa bem inusitada. Acontece que as moças estavam rifando uma noite de amor e sexo. Na verdade, nem era bem uma noite, apenas duas horas, no dia, local e horário precisamente agendado pela proposta do bilhete oferecido. Dizia assim a proposta:

            “Rifa-se momentos de prazer. Por apenas 50,00 você terá o direito de usufruir de duas horas, com duas belas jovens mulheres, que se dedicarão ao seu prazer.”

            Diferente? Promiscuo? Condenável? Excitante? Prefiro chamar de empreendedorismo, visão, sei lá... Não me dei o direito de fazer julgamentos mais aprofundados logo que soube. Mas que me causou certa curiosidade, isso sim.

            Fiquei a pensar nas muitas razões que levavam duas mulheres aquela condição. Seria talvez puro prazer? Acredito que não. Acho meio difícil alguém se submeter a tal proposta sem um motivo minimamente justo para tal, uma vez que a banalidade das relações atuais coloca o sexo como uma barganha muito sem valor. Sexo hoje é um dos prazeres mais fugazes que temos, porque o que se encontra com fácil demanda, perde mesmo seu valor de mercado.

            Não seria uma brincadeira lucrativa talvez? Apostar na excitação que causa a alguns o fato de poder pagar para adquirir algo e assim por duas horas se sentir dono? Não sei. De verdade não consegui avaliar muito bem as razões, até o momento que encontrei as tais moças e as indaguei sobre o tema.

            A princípio elas (que já eram de minha convivência), ficaram apreensivas, com medo do meu julgamento; foi quando eu as disse, que estava tudo bem, desde que tivessem sido tudo conforme o combinado e que medidas de proteção não tivessem sido esquecidas, pois isso é mais importante do que o que se faz com seu próprio corpo sob suas próprias escolhas. Mesmo assim elas sentiram vontade de contra-argumentar.

            Acontece que uma dessas moças, tem um filho autista, e essa criança solicita de alguéns cuidados especiais. Ela é mãe solo, e havia perdido seu emprego há pouco tempo, o que agravou muito suas condições de necessidades. Preocupada com as obrigações e cesta de que não encontraria outra maneira de cumpri-las ela e a amiga penaram em fazer tal oferta aos homens na cidade e de cidades vizinhas. (Elas são de fato duas mulheres jovens e bonitas.)

            Sabemos como se dá a percepção social diante de um evento desse, a mulher sempre será vista como mercadoria de desejo a realização dos prazeres masculinos, e isso tanto faz ser comercializado ou não. Já contei aqui de como os homens insistem em mulheres que os rejeitam, parece que isso os toca num ponto de excitação doentia, como animal a procura da caça. E caça boa é a difícil! Pura bobagem!! As vezes se perde uma oportunidade deliciosa só por desdenhar da caça fácil. Vá por mim, tem coisa interessante que não gosta de dificuldade, isso é ser assertivo no que quer, inclusive em relações. Mas para nós mulheres, se colocar nesse lugar de poder oferecer a sua liberdade sexual como barganha é estranho, visto que é a mulher é produto e não consumidor, os homens logo entram na disputa por ser um jogo, entende? Nem é mais o prêmio que os excita, é o fato de ganhar, de ser o primeiro. Coisa de macho!!

            Não muito distante do que assistimos hoje, o machismo e patriarcado sempre fez seus arranjos para dominar corpos femininos. Era comum na era vitoriana mulheres serem negociadas em mercados públicos, como se fazia com bichos, como cavalos, burros e porcos. Essas mulheres sentiam-se humilhadas sim; mas como já haviam sido negociadas para o casamento, e seus “donos” insatisfeitos com suas “serventias”, leiloavam suas esposas para substituírem por outras e assim não saírem no prejuízo.

            Continuando minha conversa com as moças, minha avalição a respeito foi reflexiva:  O que uma mãe é capaz de fazer pelo bem-estar de seu filho? Você já parou para pensar nisso?

            Quantas renúncias e sacrifícios cabem no íntimo de uma mulher por amor? Mas amor mesmo, de verdade. Esse que sentimos por nossos filhos, pais, irmãos, pessoas que sabemos ser capazes de não nos dedicar a mesma troca, mas que no fundo nos querem o bem. Não esse amor apego, que faz alguém se achar o dono de outro.

            A liberdade faz isso, nos liberta das amarras do que é aparentemente politicamente correto, para nos permitir experimentar campos duvidosos de nós mesmos, com todas as possibilidades de oferta a si, e ao outro. Esse leilão da liberdade me fez perceber que prazer é nada, perto das necessidades. Se é certo ou errado, quem pode condená-las? Eu não!!

            Para fechar a ideia e o desfecho dessa história, digo e repito: “O universo conspira para as boas práticas”! Mesmo as mais colocadas em dúvidas por nós.

Dos bilhetes que elas venderam, 80% dos que compraram eram homens casados, a procura de suprir com aventuras a falta de amor-próprio que esqueceram de cultivar dentro de seus relacionamentos. Ansiosos por um reforço mental que os coloca num lugar de domínio, que os faz acreditar que são suficientemente capazes de ser melhor do que eles sabem não ser. Enfim...

Quem ganhou sorteio foi um jovem, gentil, super educado e solteiro, que nem fez questão de pegar o prêmio, porque compreendeu o proposito daquilo tudo. embora ele tivesse sido insistentemente tentado por alguns outros competidores a vender o seu prêmio, ele não o fez. Pode ter certeza de que ele ganhou muito mais; ganhou o respeito de muitas mulheres, que mesmo leiloando as suas liberdades ou não, entendem que há muito mais no amor do que subentende a ganância. Essa troca de energia boa que faz o mundo fluir em paz, não tem dinheiro que compre.

 

Izangela Feitosa






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