Fases

Fases

 

Sempre gostei de boa leitura, me encanta a forma como as palavras podem ser tão bem designadas a sentimentos, que naturalmente não consigo exercer. Parece paradoxal, mas as vezes não sou tão empática comigo mesma, é sempre mais complexo executar amor em primeira pessoa.  

A escrita sempre foi um refúgio interessante, para minha aparente frieza, comecei a escrever bem cedo, morrendo de vergonha de ser descoberta, pois é lá que me revelo e me reconheço inteira, na mais pura essência de quem sou.

Não propositalmente meu poema preferido é Lua Adversa, de Cecilia Meireles. Quando o li pela primeira vez fui envolvida por um mistério, que a primeira lida não soube dizer muito bem quais eram mesmo as razões que me prendiam a ele, mas desde então me identifico.

No começo, o meu entendimento era raso, não compreendia as tais fases da lua, me parecia mais poesia do que identificação, o que mudou com o tempo, e passei a gostar ainda mais dele.

Agora me parece que Cecília compreendia muito bem essa louca estrada que nós mulheres atravessamos ao longo dos dias, meses, anos, vida. Também tenho minhas fases, dessas de desencontro, como a lua em sua grandeza. Já fui sombra, perdi a luz, recuperei a tempo num encontro com o meu sol. Nesse eclipse, que dança pelos anos amadurecendo e fazendo rever.

Há um ciclo repetitivo, que essas fases sempre trazem, mesmo novas, inéditas, nos círculos, onde não sou mais a mesma. Também tenho fases como a lua...

No princípio de lua nova, sou arisca, indefesa, investindo na ousadia de uma mulher que deseja ser acesa. Não domino a melhor vista, não desejo ser princesa, almejo apenas um lugar de brilho e beleza. A minha própria realeza, identidade bem resolvida, tão minha, tão ela.

Nessa fase em começo, sutilmente apareço, um lapso de quase nada, mas ainda estou ali. Corre tempo apareço, percebeu que eu cresci; agora virtuosa, imponente, quase ninguém diz, que sou aquele sorriso fino, um pequeno aprendiz. Tenho fases como a lua, e ela quem me diz. Se sou sua ou sou minha, imensa e sozinha, brilho prata, pura luz.

A minha solidão infinita das noites de minguancia, esconde a tristeza, que em meu coração cansa, de não saber ser luz em nenhum lugar. Meus olhos se fecham para o escuro da minha alma e nessa fase específica eu demoro a me encontrar. Sumo alguns dias, nessa fria agonia, de quase não existir.

Como em cores subtraídas recuso dores, amores, desejos. Quando passa essa fase eu torno aparecer, expondo sutilmente meu jeito de ser, aparecendo aos poucos como quem não quer ver. Tenho fases como a lua, tão minha, tão sua.

Minha diferença com Cecilia é que não mais anseio pelo encontro, pois já sei que não virá. Nas noites da minha ausência, infinita existência lunar, sou lua cheia a me declarar apenas minha. Aceito a condição de não encontro, o que perdi não desejo encontrar. Em preciso reflexo, me completo de sonhos, sem projetar ao certo o que eu quase sonhei.

As fases de uma vida refletida em meia lua, lua tantas, luas cheias de verdade e de encanto, meio louca, meio santa, meio sem jeito, perdida ou encontrada, num eterno fuso que nunca cansa de passar, sem nunca se encontrar. Tenho fases como a lua, tão minha tão sua, em todo canto e lugar.

Quantos eclipses são possíveis? Quantos terei que passar, até que minha verdadeira face se encontre na fase certa de poder amar.

 

Izangela Feitosa




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