Tarde Demais


Será mesmo o caos que nos assola? Será mesmo a doença a causa principal pra toda essa bagunça que vivenciamos agora?

Estamos isolados, mantidos presos como nunca estivemos em nós mesmos. E como tem sido difícil lidar com esse fato, lidar com a nossa própria existência, com a nossa própria companhia, com as nossas próprias manias, incertezas, convenções. Tudo se tornou tão ampliado. Corpos cheios de dores, almas cansadas de magoas, vidas lotadas de quase nada! Vazios e tão cheios.

Tem sido estranho acordar mais um dia como se fosse o mesmo. O tempo de outrora tão valioso, agora insiste em passar de forma repetitiva, constante, incisivo. Os relógios parecem ser os únicos a trabalhar realmente de forma produtiva. Embora a hora não faça mais tanto sentido. Acordamos tarde, dormimos cedo...dormimos demais...dormimos de menos. O medo é nosso despertador. Se fecho os olhos, talvez eu viaje para outro mundo! Acordar nunca foi tão difícil.

Há um misto de ansiedade tomando conta ainda mais de nós. Com um tanto de embriagues religiosa que deturba a logica das coisas. A fé passou a ser duvidosa. Não sabemos em quem confiar. Um certo desconcerto do que antes era tão correto. Pessoas que incitam a morte, outros tantos em defesa das vidas, minha, sua... de estranhos, de números que aumentam com o passar das horas. Estamos todos adoecidos, conscientes ou não.

Entramos num paradoxo de prioridades que calcula em dinheiro o valor da vida. Fome, morte, nunca tiveram tão em alta por razões diferentes, por olhares estranhos, por dessabores amargos, por conceitos de status. Parece que estamos todos loucos. Loucos !!

Talvez seja isso mesmo. Estamos loucos.

Mais de cem dias já passamos entregues ao acaso, mais de cem mil mortos e ainda não aprendemos quase nada.

Será que pelo menos já me conheci?

Será que ainda terei essa opção?

A minha solidão me machuca ou me consola? Me auxilia ou me condena?

Família, amor...já deu tempo perceber onde estão?

Cada coisa que se perdeu do seu lugar, parece nunca ter ocupado.

Pessoas se perderam... amores que acabaram, caminhos que dispersos seguem seus rumos. Momentos que jamais poderemos esquecer... (se sobrevivermos).

Sobreviver passou a ser nossa meta ideal. Nunca se deixou de lado tanto a vaidade. Mas em contrapartida outro tipo de vaidade tomou um espaço grande demais. Aquela que invade a alma da gente e que quase não sente aonde a tua noção de caridade se tornou o palco para tua arrogância. Nunca tivemos tanto tempo para pensar nela com tamanha delicadeza. Explorando a nossa própria imagem. O que somos, fomos...não mais seremos. Daqui pra frente tudo é incerto...como sempre foi! Só que agora sabemos muito bem disso!

O suicídio virou uma saída plausível. A morte dessa vez não é descartada. O invisível nos tomou conta de uma forma muito devastada. Não temos mais controle de nada.

Chorar, nem é opção. Não há lugar para desesperança, pois ela já se instalou. Procura agora um lugar para fugir e deixar o mundo pra nós melhor. Menos lotado, menos poluído, menos devastado, talvez até menos sofrido.

Quem sabe as repostas? É tudo um grande mistério.

Pequenas perdas não contam. A sensação que temos é que já se perdeu demais.

Agora espere!! O amanhã talvez não venha pode ser tarde demais.

 

 

Izangela Feitosa


Comentários

  1. Simplesmente perfeito esse texto.parabens !

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  2. Texto perfeito, parabéns!
    E a gente fica só nos devaneios da vida. Nos influxos, com a certeza que o incerto paira ainda mais as nossas vidas.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Engraçado que eu ontem conversava com um vizinho justamente essa sensação de que a humanidade vive anestesiada, de que estamos somente sobrevivendo, e não vivendo... "Tristeza não tem fim, felicidade sim"...

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