Fotografia( O Sorriso da Alma)

De vez em quando revejo fotos, releio meus escritos, e descubro um pouco mais sobre aquela pessoa que já não sou. Nesses encontros de imagens e sentimentos vividos, me deparo com uma sensação estranha do reencontro, como se por mágica fosse permitido olhar pra mim de um jeito só nosso; como num espelho ampliado através do tempo, me encontro com ela(eu) e temos muito a nos dizer.

Em um desses encontros percebi que faltava um pedaço, um intervalo esquecido onde não há escritos e nem registros fotográficos, um tempo em que eu simplesmente eu não existia. Fato é que nem me dei conta, aonde eu estive por tanto tempo.

Essa descoberta, ou melhor revelação, expos também uma necessidade, de fazer um resgate não só físico, mas visual das muitas fases que passamos. Através de fotos se pode ter uma ideia clara de como estamos nos sentindo naquele momento.

Fotografias são registros cronológicos de tempos vividos, que trazem as marcas de alegrias, tristezas, saudade... especialmente de datas importantes, mas que tem assumido uma outra percepção cronológica depois desse conceito fotográfico mais ampliando, e destorcido. A superexposição de vida, que as redes sociais nos obrigam a cultivar. A cultura do “self” esconde muito mais que revela, comparando ao que estou tentando expor aqui, ela revela exatamente o que eu perdi no tempo, a autenticidade, a identidade, a veracidade de ser.

Ela expõe opiniões destorcidas de quase verdades. Uma imagem projetada de sentimentos fingidos, tudo muito bem pensados, onde a espontaneidade perdeu a graça, e os momentos de celebração ficaram em segundo plano. É quase um pecado expor amor verdadeiro, marcas do tempo, suas tristezas reais. Tudo virou um revolucionário meio capitalista de vender felicidade pronta, e de adoecer. Estamos cada vez mais celebrando a beleza falsa, da vida fingida, esquecendo de perceber belezas reais.

Entre os vinte e poucos anos até os meus trinta e seis anos, mais ou menos, vivi um conflito muito presente nos dias de hoje: a não aceitação de si.

Passei tanto tempo ouvindo que era feia que realmente acreditei ser, passei a evitar ao máximo qualquer meio de deixar marcado para sempre aquela imagem. Por isso essas figuras fotográficas são quase inexistentes nesse intervalo de vida. Se por acaso uma vez ou outra houvesse a necessidade de assim o fazê-la, lá estava eu despida de toda e qualquer vaidade, com um olhar tristonho e uma certeza de que eu não merecia aquilo. Estranho se deparar com essa verdade, mas era exatamente assim que me sentia.

Certa vez meu marido foi questionado pelas razões que o fizeram casar-se comigo, porque seu professor simplesmente achou impossível alguém se interessar por alguém tão sem graça quanto eu. Tão sem brilho, quase nada...chegou a perguntar se tinha sido mesmo amor, pois eu tinha uma cara de pobre absurda.

Essa não foi a única vez que vivi situações dessa natureza, o mal que fazemos a nós externa e internamente repercute na forma como permitimos ser tratada pelos outros. Não é sobre estética ou padrão, é uma raiz mais profunda, que muitas vezes só nós não vemos.

Você pode questionar como alguém pode ter sido tão cruel comigo naquele momento e achar que não tinha nada demais. Mas posso lhe dizer que ele apenas me tratou da forma como eu me tratava.

Ter chegado a essa conclusão me fez perceber o quanto de “coitadismo” eu arrastei por tanto tempo, esperando que alguém de fora visse o que eu não conseguia ver em mim.  Como é possível? Lhes digo: Não é possível!

Existem imagens de nós que precisam brotar primeiro dentro de nós. E essa certeza consciente, fez mudar a ótica desse olhar. Foi quando eu perdi tudo que me encontrei de verdade, e comecei a mudança. Porque no fundo do poço, só se pode subir, não é mesmo?

E assim eu fiz, e faço todos os dias desde então, converso com essa mulher linda que eu redescobri. Lanço a ela olhares, gestos, cheiros e sabores, coisas que antes não entendia, não conhecia, não sentia. Construímos juntas uma nova identidade real, firme, imperfeita, mas muto mais convincente. Que não tem pretensões de ser um modelo pronto, mas que aprendeu a se amar. Para celebrar essa redescoberta, comecei a me fotografar. Muitos cliques, milhares...até me agradar. Selecionei muitas dessas fotos e me presenteei com um álbum muito especial, contando uma nova história, de uma beleza real. Fotografias que falam de uma mulher que renasceu, que sabe hoje namorar a si mesma, que entende as suas nuances, que adora se ver no espelho. Que mesmo nos dias ruins ainda se acha suficientemente capaz de melhorar, pois descobriu a força estética que tem o sorriso da alma.

 

Izangela Feitosa





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