Confronto

Há alguns anos eu fiz uma viagem internacional. Lembro bem da euforia e toda preparação que no momento senti por está pela primeira vez me aventurando numa cultura nova, bem diferente da que conheço aqui no meu cantinho simples de interior.

Como fomos em grupo, um amigo super organizado, já mais viajado planejou tudo nos mínimos detalhes. Lugares, rotas, passeios, restaurantes, hotel, um roteiro típico de turistas interessados por conhecimento. Afinal era isso que desejávamos. Aproveitamos o feriado de carnaval aqui no Brasil e embarcamos nessa descoberta rumo ao Chile. (Nossa que empolgante!)

Pra mim tudo aquilo parecia um sonho. Confesso que nunca havia imaginado uma coisa daquela. Quem me conhece sabe da minha realidade. Sem contar que nesse tempo eu ainda era sombra...um espaço invisível que precisa de um pouco de luz emprestada, que não acredita na sua própria luz. Enfim... seguimos.

Chegando lá, encantados com tudo de novo, fomos percebendo semelhanças e divergências culturais que nos é pertinente por sermos latinos americanos. Algumas coisas nos chamam a atenção, especialmente comportamentos, culinária e acolhimento. O Chile é realmente um lugar belíssimo e cheio de coisas muito interessantes, que eu não descobri.

Porque? Porque ao meu lado havia alguém muito mais preocupado com o que havia deixado de ganhar do que interessado em viver aquele momento.

Eu sem autonomia alguma, mesmo sedenta por viver tudo aquilo não tive como me aprofundar na beleza daquela oportunidade linda. De toda forma, aproveitei o que pude.

Mas porque estou escrevendo agora sobre esse assunto? Porque só agora, depois desse tempo todo eu recebi desse meu amigo as fotos dessa viagem. Quando me deparei com aquelas imagens, eu juro que chorei. Fui tomada por um sentimento confuso sobre mim. Simplesmente por não reconhecer quem é aquela mulher.

Onde eu estive esses anos todos? Por que me escondi de mim? O que fiz com a minha juventude? Com os sonhos que deixei morrer?

Todas as imagens captadas em fotos daqueles momentos que ainda guardo na memoria de uma felicidade forçada, de uma parte da minha vida, quase vivida, mas tão sem vida; confrontam agora com a vontade de viver. Viver de verdade!

A sensação que tenho hoje, em meio a pandemia que nos obrigou a parar no tempo, no espaço, e a repensar nossas vidas, me fazem questionar tantas coisas, deixadas para depois. Tantos lugares, sentimentos, palavras não ditas, abraços não dados, amores deixados para trás.

Eu realmente não reconheço aquela mulher. Sem vaidade, sem vontade, sem vida...existindo apenas. Servindo a um sistema, presa em uma corrente de incertezas doentias e capaz de ser escravizada por um amor que nunca o amou.

É chocante, quando se tem a noção da sua própria identidade. Por que não temos a exata certeza do que somos, sem antes nos aprofundamos em nós. Assim como a qualquer pessoa, se conhecer demanda tempo e dedicação. O silencio que habita em nossas almas é fundamental para nossa satisfação interior. Só conheceremos o amor, quando nos depararmos com a nossa imagem refletida diante de um espelho de verdades sobre nós. Despidos de tudo que passamos a vida toda escondendo.

Não é através da casca que te guarda de beleza, está na profundidade das marcas que o tempo constrói. Tua história possui mais beleza do que as fotos que são expostas tão comumente nas redes sociais de hoje. Há olhares mais interessantes a serem vistos, revistos e explorados.

Esse confronto de um tempo que ficou para trás certamente me fez um estrago enorme interiormente, hoje procuro corrigir essas ranhuras que construí sozinha, na minha ignorância, arrogância e por que não, no medo.

Medo de perder o que eu nunca tive. Medo de perder o que acabei perdendo. Medo de descobrir que eu sou.

Agora eu espero de mim uma nova viagem, nem precisa ser por lugares distantes. Preciso viajar mais dentro de mim. Há lugares incríveis que ainda não visitei, e eu sei que preciso me encontrar com uma mulher linda, nova e cheia de novos sonhos, por lá.

 

Izangela Feitosa



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