É muito mais do que um lacinho Rosa.

É MUITO MAIS QUE UM LACINHO ROSA

 

 

 

Quando eu era criança ouvi poucas vezes falar sobre o assunto. Era tido como algo tão distante e absurdo que sequer se falava o nome. Afinal, pra que falar de algo que determinava o fim? Era como uma sentença de morte anunciada, que roubava em instantes todos os planos futuros que alguém tivesse.

Por muito tempo a palavra Câncer foi esquecida das bocas e das vidas daqueles que não se deparavam com a realidade dos que tinham sido sentenciados.

Outras denominações substitutas pareciam de alguma forma esconder toda dor que aquela doença prometia trazer para os seus “escolhidos”.

O tempo passou e muita coisa mudou. A ciência fez um caminho insistente de descobertas capazes de não só detectar precocemente, como de estender a qualidade de vida dos seus acometidos, mas não mudou o medo, o estigma, a fragilidade de ser um “escolhido”.

Foi nessa fragilidade que eu me vi quando me deparei com aquelas letras impressas num exame que dizia: Probabilidade cancerígena.

Sabe quando o mundo passa devagar? As palavras ao seu redor perdem os sons? Quando você se depara por um instante na incerteza cruel de ser apenas humano?

É como se todos os seus planos estivessem agora pressionados num botão de pause, onde a sua vida não vê, naquele momento, nenhuma possibilidade. É como um ponto final!! 

Foi assim que eu me senti! Estática, a voz presa, as pernas dormentes e as lágrimas nem conseguiam rolar... eu travei!!

Não sabia se ligava pra alguém, se corria sem rumo, se me jogava no escuro dos medos ou se assumia toda a fé que eu sabia habitar em mim, mesmo esquecida.

E essa dúvida apática me acompanhou durante todo o trajeto de volta da consulta até em casa, quando eu finalmente contei o que estava acontecendo.

Durante o trajeto eu ficava me perguntando, por que comigo? Logo eu ...que sempre me preocupei com a saúde? Que faço todos os exames? 

Que me privo de tudo aquilo que podem fazer mal? Que trabalho na saúde pública, cuidado e orientando mulheres como eu?

Não podia ser verdade!

Não comigo!?

Eu chorei... por horas... por dias... em silêncio, sozinha, acompanhada, sustentando todo o mundo que agora estava sob meus ombros.

Eu desabei, desanimei, pensei no mundo sem a minha existência. Suspirei e repensei em tantas possibilidades que eu haveria de deixar pra trás. Tive medo da morte... tive demais!

O ruim de ser enfermeira é que você sabe exatamente o que terá pela frente. Essa inversão de papéis de cuidadora a paciente não me agradava, em nada.

Me olhei no espelho e me imaginei sem cabelo, desfigurada, morrendo...

Todo esse processo é normal numa situação assim, mas aí você tem, como tudo na vida, escolhas a serem feitas. Eu teria que fazer as minhas. 

Então reuni, não sei de onde, todas as forças que tinha e como num sopro de coragem resolvi lutar. Não importava se eu teria que me desfazer de algo ou até mesmo de parte de mim. Da minha feminilidade, da aparência, da vaidade. Eu queria viver!!

Fiz todos os procedimentos indicados, entre as biópsias, exames, cirurgias e correções eu fui me desconstruindo e me reconstruindo, de fora pra dentro e de dentro pra fora.

Perdi meus seios, mas ganhei tanto em amor, que jamais poderia imaginar. Uma corrente de elos fortes me suportou de um jeito tão humano e real que nada me faltou.

Percebi o quanto a minha vida faz sentido. O quanto a minha vida tem sabor, e o quanto eu quero temperá-la mais e mais. Com meus pais, meus irmãos, meus sobrinhos, meus afilhados, amigos; com todos que me fizeram entender juntos que o câncer não é o fim. Pra mim ele foi um lindo recomeço. Desses que te ensina a deixar pra trás as coisas ruins e começar a perceber o quanto há de bom nessa vida.

Eu quero viver muito!!

Linda, assumindo todas as minhas faltas, preenchendo o meu viver de amor e afeto.

O meu peito artificial, traz consigo uma história linda de verdade, que me levou do inferno do medo a certeza da cura.

O câncer não conseguiu me vencer! Ele não tem esse poder!!

Deus me escolheu pra continuar a levar a mensagem de superação e cuidado através da minha profissão. Eu entendo e aceito essa missão.

Eu tenho a graça de poder contar essa história como vencedora, não deixe você também que esse seja apenas uma bandeira de luta sem significados, assuma sua função militante e encoraje outras mulheres a vencer o câncer de mama, ou qualquer outro tipo de câncer.

Essa luta precisa de todos! Não é só um lacinho Rosa.

Não só hoje, mas todos os dias, em todos os espaços possíveis de cuidado.

Porque falar de vida é muito valioso. Vencer as dores, superar as perdas, aprender a deixar pra trás o que precisa ficar, pra seguir em frente como peito estufado de orgulho de ser quem é. 

Eu sou isso! Eu venci o câncer.


Izangela Feitosa

Para Idayana Feitosa

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